Por onde começar ainda não sei. Talvez,
por causa do cansaço, comece pelo fim. Meu passo se encheu pressa, meu braço se
encheu de peso. Tentarei pelo fim para ver se consigo arrumar o começo. Então começo
por aquilo que preciso e só entendi agora: a calma. Hoje é por isso que eu
peço: calma para minh’alma. Me escondo dos próprios medos, fujo dos meus
segredos. Me sinto como um trem fora dos trilhos. Por isso, é que peço uma trégua
de mim. Diminua tantos aperreios e lutas. Eu não consigo seguir se não maneirar
um pouco. Preciso dos freios da calma. Tanto que andei em vão. Tanta perda,
quantas ilusões e pressas. Hoje trago um passo pequeno. Quero ser pleno de dúvidas
mesmo quando tenho certezas. Permito-me ser fraco e até razões quero perder. Quero
ser assim: eu mesmo, aquilo que sou. Ter o poder de acertar o passo e em toda
manhã viver o milagre de caminhá-lo. Quero o novo no olhar, na esperança. Sem ser
hoje, aquilo que ontem fui. Ter uma oportunidade de seguir tendo a minha frente
a felicidade do dom da espera e assim poder lutar e vencer. Sem pressa de
chegar a lugar nenhum.
Não sei fingir uma cara de feliz só
pra dizer as mesmas coisas que todo mundo diz sempre. Todo mundo sabe o que é
certo ou errado. E sei que erro até demais. Segui uma estrada vazia onde poucas
vezes soube o que é ter paz na consciência. Hoje eu, e muita gente já sabe, que
o tempo é curto para ficar gastando com aquilo que não vale mais a pena. Chorar
pelo passado não adianta. É o presente que faz o futuro. Os sonhos bons precisam ser construídos sobre
um firme alicerce onde o chão da consciência é um cais, um porto de boa convivência
e de vida livre. Motivos. Buscar motivos para viver livre, poder crescer, existir,
dizer o que sente sem precisar mentir. Se vestir da pele que somos e não daquilo
que queríamos que fosse.
Quero me olhar nos olhos sem me ver
perdido. Vivendo minha própria vida e fazendo dos meus pensamentos as vias dos
meus atos. E se eu tropeçar nesses atos, nos fracassos e mentiras que eu saiba
levantar e entende que tudo é semente da qual um dia me alimentarei. Mesmo na
queda há força. Poder levantar é uma das melhores sensações do mundo. Mesmo sem
poder falar, sofrendo e perdido vou continuar firme a andar. Sustentando meus
passos mesmo sem saber por onde ir. Só assim, não parando, é que percebo que
estou sendo amado. O amor próprio, ah o amor próprio… Sou o guardião daquilo que
falo e faço. Já sei mostrar a mim mesmo por onde devo andar. Já sei evitar
alguns caminhos e pessoas. Aprendi a tomar conta e as rédeas da minha vida. Me conheço,
sou meu amigo.
Sou atrevido o suficiente para querer
ser pequeno. E essa é uma das maiores audácias que podemos ter: querer ser
pequeno. Assim, pequeno, sou movido pela esperança. Quando sou grande demais tenho
expectativas demais. Isso acaba por confundir quais são minhas metas e
prioridades. Aprendi a ser pequeno na humilhação diária. Na pedra que ouvi, nos
passos que me fizeram seguir sem que tivesse vontade, na magoa. Hoje, poucas
coisas me machucam, porque tenho muita experiência. Tenho a graça de ser
pequeno e, pequeno, não carrego mais espaço para permitir que que alguém me
ofenda. A sabedoria conquistada ao longo do tempo se alimenta do meu silencio. A
capacidade que tenho de pensar está equilibrada com a capacidade que tenho de
amar. Embora que o pensamento seja involuntário e o amor uma escolha, uma decisão.
Se quero ser lembrado então tenho que
lembrar. E isso vale também no caso de esquecer, amar e perdoar. Tudo depende de
como alimentamos. Nem sempre a vida joga bem. As coisas se destroem, as lagrimas
vem. A gente lembra do que passou. Disso ninguém avisa que vai acontecer. Daí me
percebo odiando e desprezando, sufocando o amor. Deixo o orgulho ganhar, e o
sonho desmorona, mesmo bem alicerçado. As pessoas acusam, reclamam quando não concordamos
com elas. Não tenho culpa e não sou mais enganado com isso. Não tenho mais
vergonha de minhas feridas abertas. O que quero para elas é apenas cura. Já não
fico mais buscando culpados, sei que a história ainda não acabou, ainda tenho
chance. Talvez ela, a história, só esteja começando. Hoje pode doer, amanhã não.
As vezes o passado sai de lá, de onde ele está, aparece e machuca, faz chorar. Nessa
hora lembro que sou capaz de perdoar. Assim, nada e ninguém me fere, a não ser
que eu permita. Aprendi que há muita força em soltar as amarras que nos prende
as pessoas. Nunca mais impedi ninguém de ir. Se quiser ficar, que seja na
liberdade. Se quiser partir, vá. Ficar ou partir é uma escolha. Quem decidiu ficar
ou partir é porque escolheu e ninguém pode tirar esse direito. Não sei quanto a
quem parte, mas quem fica já entendeu que vivo de perdão. Ele me levanta. É base
para o dom de amar o outro ao qual tanto almejo. A quem parte, cabe desejar uma
vida feliz, buscar crescimento, sentido na vida. Só não me impeça de viver bem
e em paz. Jamais tire os motivos que me fazem esperar, mesmo caminhando.
As vezes finjo cegueira para me
proteger do que ainda tenho medo. Tento me esquivar do amadurecimento. Mas, na alma
levo paciência. Quero fazer tudo na calma. Já aprendi que a pressa anda menos. Coleciono
algumas pedras, cada uma carregada de magoa e dor. Um dia as lapidarei. Quis um
caminho diferente daqueles que me jogaram essas pedras. Posso me olhar nos
olhos e querer voar depois voltar e contar por onde andei. Contar sobre as dúvidas
e sobre tudo que eu entendi. Poder dizer que voltei para recomeçar mesmo tendo
muito o que andar… preciso ouvir mais minha voz. Não quero mais me esconder. Quero
me fazer capaz, mesmo quando sei que não sou. Quero ir mesmo sem saber para onde.
Quero ouvir meus passos. Se doer então correrei. Quero encontrar ouvidos que me
compreendam e não me julgam por aparência ou por pressa em me conhecer melhor,
e, que me esperem de verdade. O tempo é inteiro nosso. Quero apenas celebrá-lo.